Autismo: novidades sobre o diagnóstico e o tratamento do transtorno
“Todos os dias, são divulgados na internet entre 60 e 70 novos artigos sobre autismo”, revela o neuropediatra Rudimar Riesgo, professor de medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e um grande estudioso desse distúrbio neurológico que costuma dar caras na ainda primeira infância. Riesgo conta que, apesar de o transtorno ter sido descoberto há mais de 70 anos, a ciência não conhece completamente suas causas.
“As pesquisas mais recentes fazem a gente pensar que algo acontece durante a gestação, de modo que essas crianças nascem com uma predisposição para serem autistas. E, na dependência da carga genética, somada a fatores ambientais, o autismo pode se manifestar nos primeiros anos de vida”, explica Rudimar Riesgo, que também é chefe da unidade de neuropediatria do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
No entanto, mesmo que ainda faltem muitas respostas, cientistas do mundo todo não se cansam de investigar a fundo esse transtorno – que, segundo estimativas, afeta 2 milhões de crianças só no Brasil. Reunimos algumas das pesquisas mais recentes que trazem dados sobre o diagnóstico e o tratamento do autismo. Confira a seguir.
A idade dos pais importa, sim
A associação entre a idade da mãe e o risco de autismo já é bastante conhecida pela ciência: estudos demonstram que quanto mais velha for a mulher ao engravidar, maior a probabilidade de o seu filho desenvolver esse tipo de distúrbio. Mas um trabalho de peso divulgado em junho de 2015 no periódico científico Molecular Psychiatry provou de vez que essa relação é verdadeira. E mais: a idade do pai também deve ser levada em conta, segundo o levantamento.
Na pesquisa – capitaneada por experts do Instituto Karolinska, na Suécia – foram avaliadas nada menos do que 5,7 milhões de crianças, nascidas entre 1985 e 2004 em cinco países (Dinamarca, Israel, Noruega, Suécia e Austrália). Dessas, 30 902 eram portadoras de alguma desordem do espectro autista (que inclui, além do autismo clássico, a síndrome de Asperger e outros distúrbios do desenvolvimento) e outras 10 128 eram autistas.
Os estudiosos tinham como objetivo investigar se a idade avançada do pai e da mãe era, por si só, um fator de risco para o autismo. E foi exatamente o que descobriram: os resultados evidenciaram que quanto mais velhos os pais (tanto o homem quanto a mulher), maior o risco de os seus filhos serem autistas ou terem algum transtorno associado a esse distúrbio. As análises apontaram ainda que a propensão ao problema crescia quando havia uma diferença de idade maior do que dez anos entre os genitores. “A gente tinha a ideia de que só a idade da mãe seria importante, mas esse estudo mostra que não”, comenta Rudimar Riesgo, da UFRGS.
O contato com animais faz bem para os pequenos autistas
Foi o que demonstrou uma pesquisa da Universidade de Missouri, nos Estados Unidos, publicada em maio de 2015 no periódico científico Journal of Autism and Developmental Disorders. Os estudiosos entrevistaram 70 famílias que tinham filhos autistas com idades entre 8 e 18 anos. “Quando comparei as habilidades sociais de crianças com autismo que viviam com cachorros em relação àquelas que não tinham esse contato, os pequenos que eram donos de um cão se saíram melhores”, relata Gretchen Carlie, líder da investigação.
E não pense que os bichinhos que traziam esses benefícios eram só cachorros. “Os resultados revelaram que crianças que tinham qualquer tipo de animal de estimação eram mais propensas a ter atitudes como se apresentar, pedir informações ou responder a perguntas de outras pessoas”, diz Gretchen. Esse tipo de comportamento não é comum nos pequenos autistas, que tendem a ser mais introvertidos
Segundo Rudimar Riesgo, neuropediatra e professor de medicina da UFRGS, esse estudo prova algo que, clinicamente, já se notava. “A gente já estimula que essas crianças ajudem a escolher um pet, se responsabilizem pela alimentação e pelos cuidados com o animal”, conta o médico.
Mas calma: antes de aderir a esse tratamento é preciso levar em conta vários fatores, como a espécie do animal, a personalidade e a idade da criança. “Com 1 ano, por exemplo, o pequeno tem um equilíbrio muito frágil e uma habilidade motora não muito boa”, pondera Riesgo. Segundo ele, esse tipo de contato é mais indicado para aqueles que já completaram o segundo aniversário.
A musicoterapia acalma crianças com o distúrbio
Está aí outra associação que vem sendo bastante estudada por cientistas mundo afora. Isso porque a música, por si só, diminui o estresse e ajuda a relaxar – o que contribuiria para aliviar problemas comportamentais de crianças autistas, como a tendência a serem barulhentas, inquietas e até agressivas. Em um estudo divulgado no periódico Pertanika, pesquisadores da Universidade Sains Malaysia, na Malásia, reforçaram esse elo.
Eles recrutaram 41 voluntários mirins, que foram divididos em dois grupos: o primeiro era composto de 18 crianças com idades entre 2 e 10 anos; o segundo contava com 23 adolescentes de 11 a 22 anos. Os participantes fizeram sessões semanais de musicoterapia ao longo de dez meses. A avaliação comportamental foi realizada pelos pesquisadores e também pelos pais e professores de música da garotada. Os resultados mostraram que esse tipo de tratamento ajudou os pequenos autistas a melhorarem comportamentos como agitação, birra e desatenção.
Mas os benefícios da musicoterapia não param por aí. Indiretamente, o método acalma por ajudar no desenvolvimento da comunicação nos pacientes autistas. “Além de não terem recursos sociais, eles não dominam a linguagem. Com isso, se estão aborrecidos, não conseguem dizer. E, assim, não contam com a principal válvula de escape, que é a fala”, explica o neuropediatra do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. A musicoterapia é indicada para todas as faixas etárias. “A criança pode ser estimulada com música desde o útero”, garante Rudimar Riesgo.
Os sintomas podem aparecer desde cedo
Em um trabalho publicado em junho de 2015 no periódico Current Biology, pesquisadores da Universidade de Londres, na Inglaterra, notaram que uma capacidade visual apurada aos 9 meses de vida seria capaz de prever a probabilidade de o pequeno ser diagnosticado com autismo mais pra frente.
Para chegar a essa conclusão, os estudiosos avaliaram 82 crianças, sendo que 37 delas eram meninas com alto risco de serem autistas por terem irmãos com o distúrbio. Os pesquisadores partiram do pressuposto de que pacientes com autismo orientam seu olhar para qualquer coisa que se destaque no seu campo de visão. Por isso, expuseram os pequenos a uma tela com várias letras iguais e, no meio delas, havia algumas diferentes. Utilizando um aparelho, os cientistas rastrearam o caminho percorrido pelos olhos dos participantes.
Acompanhando os voluntários, os especialistas notaram que aqueles com uma habilidade visual maior aos 9 meses eram também os que apresentavam mais sintomas de autismo aos 15 meses e aos 2 anos de idade.
No entanto, apesar dos resultados animadores, ainda não dá para dizer que esse achado vale para todos os autistas – é preciso investigar mais a fundo essa associação. “Na realidade, um dos sinais mais precoces para diagnosticar o autismo é justamente o contrário: a criança deixa de fixar o olhar”, adverte Rudimar Riesgo. Segundo o professor da UFRGS, outros sintomas desse distúrbio que podem aparecer antes de 1 ano de idade são atraso na fala, problemas de sono e quando o pequeno não atende o próprio nome.